AMARAL, O TAXISTA !

Ganho a vida como motorista de táxi. Encontrei pessoas cujas vidas surpreenderam-me, enobreceram-me, fizeram-me rir e chorar. Nenhuma, tocou mais, do que a que contarei hoje.
Era fevereiro...
Eu havia recebido uma chamada de um pequeno prédio de quatro andares. Quando eu cheguei no início da madrugada, o prédio estava escuro, com exceção de uma única lâmpada; acesa numa janela do térreo. Assim fui até a porta e bati. “Um minuto”, respondeu uma voz.
Uma octogenária sorridente apareceu. Olhei e percebi que toda sua mobília estava coberta por lençóis. Não havia relógios, roupas ou utensílios sobre os móveis. Eu peguei a mala e caminhei vagarosamente para a calçada, ela ficou agradecendo minha ajuda.
Quando embarcamos, ela deu-me o endereço e pediu:
- Poderia passar pela rua Manoel Cavassa?
- Não é o trajeto mais curto - alertei-a prontamente.
- Eu não me importo. Não estou com pressa, pois meu destino é um asilo. Uma neta quer se batizar na umbanda, a outra casou e está trabalhando na praia com negócios imobiliários e o outro cuida de cavalos, mas não pensam muito em mim. São poucos recados e se eu ligo muitas vezes nem atendem. Não respondem recados e muito menos agradecem a preocupação.
Eu olhei pelo retrovisor. Os olhos dela estavam marejados, brilhando.
Eu disfarçadamente desliguei o taxímetro e perguntei:
- Qual o caminho que a Sra. deseja que eu tome?
Nas duas horas seguintes circulamos pela cidade.
Ela mostrou-me o edifício que havia, em certa ocasião, trabalhado; depois passamos pelas cercanias em que ela e o esposo tinham vivido em outros tempos: hoje um depósito de móveis, que havia sido um grande salão de dança.
De vez em quando, pedia-me para dirigir vagarosamente em frente a uma casa ou esquina - ficava então com os olhos fixos na escuridão, sem dizer nada. Quando o primeiro raio de sol surgiu no horizonte, ela disse de repente:
- Vamos agora!
Viajamos, então, em silêncio, para o endereço que ela havia me dado.
Chegamos a uma casa de repouso. Dois atendentes caminharam até o táxi, assim que ele parou.
Eu abri a mala do carro e levei a pequena valise para a porta.
A senhora já estava sentada em uma cadeira de rodas.
- Quanto lhe devo? - ela perguntou, pegando a bolsa.
- Nada - respondi.
- Você tem que ganhar a vida, meu jovem !
- Há outros passageiros - respondi.
Quase sem pensar, eu curvei-me e dei-lhe um abraço. Ela me envolveu comovidamente. - Você me deu bons momentos de alegria – Qual seu nome ?
- Amaral.- respondi prontamente.
Apertei sua mão e caminhei no lusco-fusco da alvorada. Atrás de mim uma porta foi fechada. Ao relembrar, não creio que eu jamais tenha feito algo tão importante na minha vida. Nós estamos condicionados a pensar que nossas vidas giram em torno de grandes momentos e da busca diária de valores pecuniários. E sinceramente, permita-me discordar! Saúde, bons relacionamentos, valorizar o amor, a gratidão, o respeito a família e nunca esquecer o que já foi feito em nosso favor, são caminhos para a tranquilidade da vida.
Esta crônica é em homenagem ao Amaral Ex Presidente do Sindicato dos Taxistas mas que na verdade chamava-se Claudio dos Reis Rodrigues e que foi homenageado recentemente por intermédio do atuante Edil Nelsinho Dib, no ponto de táxi da fronteira Brasil x Bolívia. Como deferência e referência a ombridade e urbanidade dos taxistas corumbaenses com os usuários das duas cidades fronteiriças e com o público em geral. Bons exemplos devem ser sempre enaltecidos.
*Articulista
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