Corumbá, Quarta, 28 de Maio de 2025
Geral

ATÉ EM PRETO E BRANCO O PANTANAL É COLORIDO!

|
Armando Arruda Lacerda

Mudou de plano hoje Sebastião Salgado, que tivemos a honra de guiar em suas visitas ao Pantanal em 2011.

O saudoso Comandante Getúlio o deixou na Fazenda São Luiz com um sol tinindo no início da tarde.

Acomodei-o no quarto de hóspedes junto com seu companheiro Claude Barthélemy , e ficamos na varanda onde ele acomodou-se numa cadeira de balanço, a recuperar-se dos sacolejos do vôo.

Depois de algum tempo, quando o ouvi iniciando uma cantarola, perguntei-lhe como tinha sido o almoço em Poconé.

Como previa ele disse que não almoçaram prevendo a turbulência de um vôo naquele horário e a baixa altura no Pantanal.

Disse-lhe que nosso rabeteiro Carmo havia saído de manhã no rumo do Corixo Vermelho, e voltara com um capado gordo de javali, que seria nossa matula na longa viagem ao Porto São Pedro.

Pareceu-me que voltara à vida enquanto comunicava o companheiro gaulês Claude, certamente conhecido adepto de javalis fritos ou assados…

“-Frito em pedaços?” indagou: “-Sim, colocado numa lata com a banha da fritura, é nossa matula para amanhã e depois de amanhã, junto com mandioca ferventada e farinha” respondi-lhe .

“- Gostaria de ver? O Sebastião esta assando uma paleta e costela lá no quintal, e eu tenho uma dúzia de latinhas que coloquei ontem no congelador!”

Pulou como uma mola, deu uma gargalhada , e disse ao Claude em francês: “- Agora chegamos ao verdadeiro Pantanal, meu amigo!”

Acomodados num banco ao lado do Sebastião e do Carmo, que nos ofereciam as facas para lampinar o assado, à sombra de um pé de tamarindo, degustamos demoradamente o javali, entre cantarolas e resmungos de satisfação do francês, certamente descendente da irredutível aldeia gaulesa, imortalizada por Uderzo e Goscinni.

Nos outros dois dias, horas e horas de muito trabalho , com intervalo somente para apreciarmos os bocados fritos com farinha e mandioca ferventada, compartilhando com os piloteiros

Guardei dessas visitas do Sebastião a verdadeira obsessão que ele tinha para consumirmos água de um garrafão sem refrigeração, dizia que vira muitos lugares no mundo quase cobertos por garrafinhas ou latinhas individuais descartadas na natureza…

Encerrada essa nova maratona, já no Porto São Pedro, enquanto aguardávamos o avião que o levaria de volta, eu e Marli pedimos licença para tietá-lo um pouco, conversando sobre o Pantanal que ele vira conosco.

Ele afirmou “- A marca que devemos deixar no Pantanal é do turismo e não da destruição. O turismo não fere, é uma alternativa de distribuição de renda sustentável”. Ele lembrou que na sua região, no Vale do Rio Doce, a Mata Atlântica foi destruída pela agropecuária. Realçou, no entanto, o comprometimento do homem pantaneiro com o seu ambiente, para ele “um exemplo”.

O livro “Gênesis ” traz as magníficas fotos dessas expedições ao Pantanal, imortalizando nossos amados corixos , nosso céu, a flora e fauna, com a magia dos detalhes que só as fotos em preto e branco podem proporcionar.

Assim como Gérard Moss o aviador suíço que escolheu o corixo do Mata Cachorro para acolher suas cinzas, o respeito que Sebastião Salgado demonstrou pela cultura pantaneira, vai permitir que ele de quando em vez abandone as montanhas de sua Minas Gerais e venha seguir o exemplo de tantos pantaneiros quando mudam de plano, e continuam a salgar esta terra pantaneira “sofrendo” o calor de rachar e frio de gemer, as mordidas e picadas de mosquitos, mutucas e carrapatos assombrando em infindáveis viagens a cavalo, de canoa, batelão ou carro de boi pelos infinitos rios e estradas deste Pantanal Paraíso.

Nossas condolências à Senhora Leila Wanick, seu filho Juliano e o irmão, o inseparável Claude e todos os amigos que amaram Sebastião e foram por ele amados, lembrando suas palavras quando afirmava: “- Estamos escrevendo e descrevendo o Gênesis no Pantanal, mesmo que tantos tentem produzir um Apocalipse no Mundo.

(*)Porto São Pedro
23/05/2025

SIGA-NOS NO

Veja Também

Presidente do Concen-MS participará de painel no encerramento do SENDI 2025

Formandos salesianos e diocesanos encerram projeto acadêmico e aprofundam reflexões sobre a busca espiritual

Trabalho escravo: proprietário rural de Anastácio (MS) vai indenizar três vítimas em R$ 240 mil

DPU garante salvo-conduto para assistido cultivar cannabis medicinal