MPF/MS questiona planos para Hidrovia do Rio Paraguai em audiência pública
Ministério Público Federal no MS levantou diversos pontos cruciais sobre os potenciais impactos da concessão.

A pedido do Ministério Público Federal (MPF), a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ) realizou, na última quinta-feira (10/4), no Centro de Convenções do Pantanal de Corumbá Miguel Gómez, em Corumbá/MS, uma audiência pública para debater o aprimoramento dos documentos e da modelagem para a concessão da Hidrovia do Rio Paraguai.
A sessão, que ocorreu de forma híbrida (presencial e virtual), contou com a participação do procurador da República Marco Antonio Delfino de Almeida e da pesquisadora da Embrapa cedida ao MPF Débora Fernandes Calheiros, que fizeram uso da palavra, além dos servidores Thiago Guimarães Cabreira e José Mario Silva de Araujo.
Alerta para impactos ambientais e hidrológicos
Em sua exposição, a pesquisadora Débora Fernandes Calheiros levantou diversos pontos cruciais sobre os potenciais impactos da concessão. Inicialmente, reconheceu a histórica integração entre os países da bacia e a navegação no trecho sul, mas expressou a preocupação dos pesquisadores com o aumento projetado para 30 milhões de toneladas de carga, especialmente diante da possibilidade de anos de seca, conforme indicam estudos climáticos para a região.
Débora questionou a viabilidade da navegação durante 365 dias por ano, relembrando o respeito histórico aos períodos de seca do rio. Ela também enfatizou a necessidade de um estudo aprofundado sobre os efeitos cumulativos das futuras dragagens, uma vez que o trecho sul do Rio Paraguai nunca demandou tal intervenção. A pesquisadora solicitou esclarecimentos sobre a possível realização de dragagem de aprofundamento, alertando que, sem ela, a navegação em períodos de seca seria inviável, contradizendo a promessa de operação contínua.
Outro ponto de destaque foi a informação, previamente divulgada pelo Superintendente de Estudos e Projetos Hidroviários da ANTAQ, Bruno Pinheiro, sobre a encomenda de 400 balsas e 21 empurradores maiores por uma empresa de mineração local. Débora questionou a necessidade de verificar junto à Capitania dos Portos se essas embarcações maiores teriam permissão para navegar no trecho.
A pesquisadora também reiterou a importância da análise cumulativa e sinérgica de todos os impactos do projeto e defendeu a participação efetiva das comunidades tradicionais ribeirinhas nas audiências públicas, considerando seu potencial impacto. Ela relembrou um período de dez anos de seca na década de 1960, questionando os efeitos de um evento climático extremo similar na concessão. Por fim, Débora defendeu a revitalização da ferrovia de Corumbá como forma de promover o transporte multimodal, especialmente em períodos de estiagem.
Questionamentos sobre derrocamento, captação de água e participação comunitária
O MPF/MS também apontou que perguntas cruciais relacionadas ao derrocamento de rochas no leito do rio, intervenções na captação de água e a situação do farol tombado não foram respondidas durante a audiência. Outro ponto de preocupação foi a baixa participação das comunidades tradicionais, possivelmente devido à alegada pouca divulgação do evento. Ao final da audiência, um representante dessas comunidades solicitou uma nova sessão em horário mais acessível e focada nos impactos ambientais e cênicos da hidrovia em Corumbá.
Ademais, o Ministério Público Federal no MS identificou uma inconsistência na informação sobre o número de pontos de dragagem. Enquanto representantes da ANTAQ mencionaram entre 12 e 23 pontos, os documentos da Consulta Pública indicam 33 locais para intervenção.
Divergências em dados técnicos preocupam o MPF
O procurador da República Marco Antonio Delfino de Almeida também apresentou importantes questionamentos. Ele confrontou a informação do Secretário Nacional de Hidrovias e Navegação do Ministério de Portos e Aeroportos, Dino Antunes, sobre um volume de dragagem de 350 mil metros cúbicos, com a Nota Técnica 19/2024 da INFRA S.A., que aponta 670 mil m³ para toda a dragagem e cerca de 850 mil m³ apenas no Canal do Tamengo, nos serviços iniciais.
Outra divergência apontada por Marco Antonio foi a negativa de Dino Antunes sobre a realização de derrocamento, contradizendo a mesma nota técnica que prevê essa intervenção no Canal do Tamengo, especificamente na formação rochosa onde se localiza o Farol Balduíno, um patrimônio tombado pelo IPHAN.
O procurador também questionou a falta de clareza sobre a Área de Influência da concessão, alertando que a minuta do contrato deixa em aberto a possibilidade de inclusão de novos trechos, sem especificar as atividades que poderão ser realizadas nessas áreas. Por fim, ele reiterou a ausência de estudos que avaliem os efeitos sinérgicos e cumulativos das dragagens planejadas.
ANTAQ defende previsibilidade e segurança da navegação
Em sua fala de abertura, o diretor e relator do processo na ANTAQ, Alber Vasconcelos, destacou que o trecho da concessão já possui navegação consolidada há décadas e que a proposta visa estruturar um modelo que traga previsibilidade e segurança à navegação, e não abrir um novo eixo logístico. Ele ressaltou o aumento da movimentação de cargas na hidrovia nos últimos anos.
O diretor explicou que o futuro concessionário será responsável por manter a hidrovia operando durante todo o ano, com obrigações em dragagem de manutenção, monitoramento hidrográfico, sinalização náutica, gestão do tráfego aquaviário e gestão ambiental.
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